(...) Transferida para o domínio da governação, a ciência é uma forma de despotismo que obrigaria a renunciar a direitos civis. Grande parte do nosso comportamento quotidiano não é guiado pelo saber e as prescrições da comunidade científica. Teríamos uma vida infeliz se assim fosse, por mais que respeitemos, admiremos e vejamos a ciência como o principal factor de cultura e civilização. O prolongamento da situação actual de pandemia, tal como ela é gerida, comporta imensos riscos políticos, como já todos percebemos. Um deles é que a democracia se torne em "democratura", para usar um neologismo que começa a impor-se e a seguir o seu curso. Aquém e além da situação excepcional em que vivemos, isto é, analisando uma disposição que não nasceu com a pandemia, é notável que os cidadãos se mostrem favoráveis à substituição da política pela ciência. E isso acontece por causa da política fraca em que caímos (e, por todo o lado, os recentes arautos de uma política forte, quando falam de política estão antes a falar de polícia) e da falta de um poder e de um debate políticos que tratem os cidadãos como adultos. O discurso dirigido aos cidadãos durante a epidemia inclinou-se para uma moralidade e infantilidade insuportáveis porque essa é a regra já antes instaurada. (...)
António Guerreiro, aqui.
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