Na ferrovia, o orgulho de pertença anda numa frequência distinta dos calendários, como se a passagem dos anos jamais pudesse diminuir sentimentos. Júlio, crescido já fora da estação sem nunca a perder é também prova disso. Naquela geografia, mais do que noutra qualquer, habitam emoções prosaicas agigantadas. O barulho constante, de silvos e de gente, e o fumo, sempre o fumo. Das máquinas a vapor, a carvão, a lenha, e depois ainda a óleo, as mais temidas pela avó, sempre a correr a recolher a roupa da corda do quintal. Tudo parece ter sido ontem. O gato Nico a fugir para os telhados da estação, as visitas do barbeiro a casa, o "polícia do canário", que trabalhava na gare e um dia lhe ofereceu um pássaro, os melões vindos de Almeirim e vendidos em vagões à porta da estação, a senhora muito malcriada com quem aprendeu muitas asneiras.
Mariana Correia Pinto, Porto, última estação.
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