São longas e delicadas as tardes das terças-feiras. Chalana tem calo de décadas, mas ainda chega exausto ao fim do dia. O Lagarteiro já não é o bairro onde chegou em 1997, explicado numa pichagem que era cartão de visitas: "Bem-vindos ao inferno." Ele sentia-se nele. Seringas no chão, o tráfico a crescer, a SIDA a matar, assaltos, tiros, prostituição, pobreza. A cada pedido, perdia-se um pouco mais: uma casa nova, um emprego, uma vaga no infantário, dinheiro para pagar o supermercado e medicamentos. A angústia de não poder resolver os problemas era corrosiva. "Pensei muitas vezes: não consigo fazer isto." Tinha então 30 anos. Estava entre a paixão da luta e a busca do equilíbrio - não tinha ainda decidido que as regras, quando são injustas, são para ser quebradas.
Mariana Correia Pinto, Porto, última estação
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