Mostrando postagens com marcador energia. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador energia. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Gonçalo M. Tavares dixit

Energia e ética

Sei isto: a minha energia está canalizada
Para a palavra fazer, gosto da ideia de construção
E o que dela existe nos movimentos normais.
Agrada-me a palavra engenharia e o que ela
Representa: não saias de um sítio sem deixares algo
Atrás de ti. Dirijo-me apenas às coisas que me excitam
Positivamente e me levam a fazer outras coisas, dirijo-me
Às pessoas de que gosto, nunca às que não gosto;
Sempre me pareceu insensato que na vida se pare,
Nem que por um momento, de admirar, há
Sempre actos e coisas que nos ajudam
neste cálculo infernal da distância entre o dia de hoje
e a nossa morte. E qualquer pessoa dar um passo que seja
em direcção ao que não aprecia, para insultar, ou derrubar,
parece-me brutal perda de tempo, uma falha grave
no órgão de admirar o mundo
(deves combater uma ou duas vezes na vida,
se combateres duzentas vezes
é porque os combates são fracos).
Não sei pois como viver. O que li e vi
Serve-me apenas para ser mais lúcido, não
Para ser melhor pessoa. Adquiri esta regra (ou nasci com ela)
– e é talvez uma moral –
mover-me apenas em direcção ao que gosto.
Se o prédio alto, escuro, feio
me impede de ver o sol, não fico a insultá-lo, não
moverei um dedo para o deitar abaixo:
contorno sim os edifícios necessários
até chegar ao espaço de onde possa receber aquilo que
quero. Se chegar lá de noite, montarei acampamento.

Gonçalo M. Tavares -1, Relógio D’Água, 2004.

domingo, 11 de agosto de 2013

Olímpia Jack

Na estrada que vai para Patrai e que está marcada no mapa com raminhos de oliveira e cachos de uva como os que produzia a terra prometida, estava Jack, o de Olímpia. Tinha mudado; os rios pedregosos e secos pareciam despertar-lhe estranheza; e olhava a paisagem humana das pequenas vilas sem ocultar que se surpreendia. Uma lucidez desesperante tinha alterado o seu espírito. O mundo emergia do caos, e a luz era ele agora quem a irradiava. Mas não reconhecia o que via.

- Não viajarei mais - disse ele, como se descobrisse uma identidade estranha que lhe pertencia. Vi-o andar no cais ao escurecer, e a sua figura esguia, o barco cheio de luzes e que não era o dele, comunicavam quase uma sensação de pobreza enganada pelo vil desprendimento. Da energia humana ninguém sabe ainda nada. Ela converte os homens em joguetes fantásticos, dá-lhes voz e razão, segreda-lhes as verdades ocultas no cosmos, e enche-lhes o vazio cérebro de respostas sublimes ao seu próprio destino. E faz com que a terra produza frutos maravilhosos, entre os quais a força do que se espera indefinidamente. 

 - Agustina Bessa-Luís, Conversações com Dimitri e outras Fantasias.