quinta-feira, 30 de julho de 2020

O óbvio

Um casal emigrante vive no andar de baixo. Desde o início, surpreendeu-nos a postura da Mãe e dos Filhos. Nunca dão Bom Dia, Olá, Boa noite. Limitam-se a baixar os olhos. O Pai não. O Pai cumprimenta com naturalidade. O Pai é o único que trabalha, mas os miúdos andam na escola. Os miúdos são pré-adolescentes, mas a Mãe ia levá-los à Escola e trazê-los durante o ano. Iam a pé, pareciam três crianças. Quando vieram para cá, se chegássemos ao mesmo tempo que eles, a Mãe mandava os filhos correr à nossa frente e entrar em casa primeiro. Nunca percebemos porquê. O Pai trabalha de noite e quando volta, às 5.45 da manhã, já eu estou acordada há pelo menos meia hora. Apesar de o dia ainda não ter começado e a nossa rua estar mergulhada no mais perfeito silêncio, a Mãe lida na cozinha com a naturalidade do meio-dia. É isto todas as madrugadas, menos na do Domingo - a única em que o Pai não trabalha. Ocorreu-me esta manhã, porque ouvi os miúdos, que fazem as refeições no horário do país de origem - não sei se acompanhando familiares pela net. E se isso, durante o dia, não me estraga a rotina - trabalho quase sempre com phones... - à noite está a ser complicado. Adormeci pouco antes das sete e sonhei que vivíamos todos não aqui no campo, mas no prédio onde eu morava antes, no Porto, e decidíamos, em condomínio, como explicar o óbvio sem melindrar. Às sete e meia, estava de pé. Prevejo uma dor de cabeça monumental. Eles dormem.

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