segunda-feira, 4 de maio de 2020

A Martinha

Uma pessoa que, como eu, não tenha televisão está protegida de muita coisa. Uma pessoa que tenha Facebook e procure informar-se pelos canais que considera mais fidedignos na internet, está protegida de muita coisa. O meu feed do Facebook, por exemplo, é uma caixa de ressonância daquilo que eu penso; as plataformas que uso para obter informação respondem às minhas perguntas de um modo que eu considero razoável e satisfatório. Mas o país e o mundo não é a minha rede de amigos no Facebook, nem a Atlantic, nem a New Yorker, nem o New York Review of Books

O país detesta a Ministra, uma mulher sem filhos, racional e competente, e o mundo não entende o confinamento do povo, mas não dos políticos. O país está revoltado porque a, b e c foram à Assembleia celebrar o 25 de Abril e x, y e z ao Parque Eduardo VII para o 1.º de Maio, mas o povo não pode passar os filhos para a alçada dos avós, os shoppings e os restaurantes não podem abrir, os médicos não podem ganhar mais, ainda não pode haver uma vacina, e nada poderá ser como era antes. A culpa é da Martinha. Foi a Martinha que decidiu, a Martinha que avaliou, a Martinha que não quer pagar, a Martinha que não faz uma vénia e se ajoelha em directo perante todos os profissionais que fazem o que a profissionais compete.

Já pensei que a culpa fosse da Escola - tendemos sempre a colocar o problema na nossa área -, que a Escola ensina pouca estatística, não propõe estudos de caso, não implementa o método científico, não se presta à interpretação das nuances, desvaloriza o peso da mais pequena dissonância na vida... Depois concluí que o problema é social, cultural, mas sobretudo pessoal. E está na perda do hábito da leitura. A gente não lê, os estímulos do meio envolvente não ajudam, é-se incapaz de empatia, não se sabe analisar uma situação complexa; em suma, pensa-se pouco e mal. É assim que estamos todos entregues ao perigo maior que é a ignorância boçal activa. 

Fica aqui o melhor artigo que li para explicar por que é tão complicado comunicar, prevenir, tratar, viver e sobreviver ao momento actual.

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